sábado, 6 de junho de 2009

M115 – RANGER/COMANDO Parreira (Extracto do blogue de Luís Graça & Camaradas da Guiné)

(João Parreira)

Já não é a primeira vez, nem será a última se Deus quiser, que menciono neste blogue, um dos sítios mais visitados na internete, que é indiscutível e inequivocamente o blogue de grande envergadura e sucesso de Luís Graça & Camaradas da Guiné. 

Tal como disse na mensagem M104, o que começou por ser uma distracção do Dr. Luís Graça (sociólogo do trabalho e da saúde, doutorado em saúde pública e professor na Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa, em Lisboa), que cumpriu a sua comissão militar em tempo da Guerra do Ultramar na Guiné, na CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71, tornou-se um caso sério em matéria de comunicação e intercâmbio cultural de vários géneros, dando sempre relevância a tudo o que de algum modo se relaciona com a frente da Guiné, durante a Guerra que os portugueses suportaram em África. 

O blogue também tem o condão de unir em volta dos textos e fotos publicados uma interessante tertúlia de amigos e camaradas ex-Combatentes não selectiva, uma vez que tem também ex-Combatentes de outras frentes e outros amigos que se vêm juntando à “tertúlia”, inclusive alguns que colaboram a partir da inesquecível e estimada Guiné-Bissau. 

Contando actualmente com mais de 300 “tertulianos”, o blogue conta com mais de 1 milhão (1 000 000) de visitas e 4 mil e tal mensagens em 4 anos de existência. 


Visitem-no diariamente que não se vão arrepender. 

Com a anuência, que desde já muito agradeço dos meus bons Amigos Luís Graça e João Parreira, transcrevo a seguir um extracto de um dos postes (mensagem), de 1 de Agosto de 2007, com o título: Guiné 63/74 - P2020: Memórias dos Lugares (1): de Elvas a Bissorã e de Lamego a Biambe, com a CART 730 (Parte I) (João Parreira)

Nesta mensagem da autoria do João S. Parreira, ex-Fur. Mil RANGER/COMANDO da CART 730/BART 733 (Guiné 1964/66), a propósito do Encontro da CART 730, efectuado nesse ano de 2007 no Algarve, aproveitou e bem, digo eu, segundo as suas próprias palvaras, para recordar o percurso nas casernas militares, em Elvas e Mafra, e da sua passagem por Lamego até dar com os costados em Bissorã (Guiné). 

Aconselhando vivamente e mais uma vez, a lerem o artigo na íntegra no link que acima mencionei, passo então ao extracto: 

(…) gostaria de recuar uns meses. 



No CIOE 

Bem conhecido de alguns Camaradas tertulianos, já que alguns o frequentaram. Tomei a decisão a seguir descrita na operação, porque naquela altura ainda me sentia muito auto-confiante, talvez devido à aprendizagem de várias semanas que tinha recebido meses antes em Portugal nas duas fases do Curso, Mafra e Penude, que decidi frequentar, pois sabia de antemão que mais cedo ou mais tarde iria parar ao Ultramar. 

Encontrava-me em Caçadores 8, em Elvas, donde seria enviado para uma Unidade Mobilizadora, pelo que antes que tal acontecesse ofereci-me para o Curso pensando que assim poderia ir melhor preparado para a guerra de guerrilha e, deste modo, salvar a pele. 

Elvas, cidade militar, traz-me boas e más recordações, estando entre as primeiras as valentes farras que durante as folgas, na companhia do nosso novo tertuliano, Mário Fitas (RANGER), fazíamos nas povoações vizinhas. 

E entre as más, já agora porque não uma de caixão à cova? Bom. Estava de sargento de ronda, e como tal o condutor ia-me deixando à porta de cafés, bares, tascas, etc.,onde não deixava de beber aqui e ali um tinto ou uma cerveja até que a última que me lembro foi quando de regresso me encontrava a escassos metros do Quartel.

Na manhã seguinte quando acordei completamente nu no quarto que tinha alugado num primeiro andar não me lembrava absolutamente de nada a não ser que tinha uma forte dor de cabeça devido à ressaca tendo pouco depois ficado apavorado ao reparar que não tinha a pistola, as botas, o bivaque e a farda. Enfim... 

Nunca tendo tido a oportunidade de me encontrar com pessoal que frequentou o CIOE nos anos seguintes, e com o propósito de trocar recordações, aproveitei a presença no encontro do passado dia 28 de Abril em Pombal de um dos nossos camaradas da tertúlia, o Fernando Chapouto, que, para surpresa minha, me deu conhecimento que no final do ano de 1964, ou seja passados poucos meses, o curso foi alterado para uma só fase - e a razão da qual gostaria de saber - que foi ministrada em Lamego, ficando os instruendos instalados no Quartel daquela cidade. 


(O General Ranger Rodolfo Bacelar Begonha foi o 1º. Oficial português a frequentar o Curso de Ranger nos EUA em 1962) 

Em Abril de 1960, com a extinção do Regimento de Infantaria 9, foi criado o Centro de Instrução de Operações Especiais, conhecido como Rangers e cujos cursos se iniciaram em 1963. 

Como curiosidade, faço uma descrição muito sumária dum Curso iniciado em 4 de Maio 1964. Já se passaram mais que quatro décadas e nunca vi nada escrito sobre o assunto. 

Naquele tempo, como se sabe, ainda não existiam Comandos formados em Portugal. 

Depois de exames médicos efectuados no Hospital da Marinha e da respectiva selecção em Mafra, ficaram aprovados 41 instruendos para frequentar um dos primeiros cursos de Rangers, regressando os outros às suas Unidades. 

No C.M.E.F.E.D. (Centro Militar de Educação Física e Desportos) em Mafra, onde decorreu uma das duas fases, foi-nos logo dito que ali era tudo em passo de corrida. Aplicaram-nos uma disciplina férrea e uma mentalização constante reservando-nos para as manhãs um crosse diário e progressivo, vários exercícios físicos, que sem nos darem descanso, levavam uns ao desespero e outros até aos limites das suas forças. Ficámos alojados em pequenos quartos no último andar do Convento de Mafra. 

(Exercíco na Barra)

Quando era necessário ir mudar de roupa para novos exercícios davam-nos 5 minutos, caso demorássemos mais éramos obrigados a fazer o que nos mandavam e que geralmente eram flexões, cangurus, etc. 

O cenário dos exercícios era a Tapada, a piscina, o tanque, o campo de tiro, as estradas, as praias e as escarpas. 


(Sobre o olhar atento de um instrutor os cabos milicianos aguardavam a sua vez para individualmente receberem instrução na água) 

Da parte da tarde eram ministradas aulas teóricas sobre organização militar, táctica geral, organização do terreno, itinerários, patrulhas, coordenadas topográficas e militares, orientação da carta, sobrevivência, combate na selva, etc. 

De vez em quando ao fim da tarde tínhamos prática de tiro, lançamento de granadas e exercícios de rastejar com a arma nos braços sobre a lama e por baixo de arame farpado, sobre o qual um sargento com uma metralhadora montada num tripé fazia fogo a rasar. 

CIOE-Penude 

Os 41 instruendos, sob a direcção do Cmdt. Ten-Cor. Flamínio Machado da Silveira, eram orientados por 5 instrutores e 7 monitores. Ficámos isolados num monte e instalaram-nos em 2 tendas enormes, uma para os 2 Alfs.(Inf. e Cav.) e 19 Asps.of.mil. e a outra para os 20 1ºs. Cabos Mil. Um deste Alf., o de Inf. José Alberto Cardeira Rino, alcançou em 1999 o posto de Ten. General, Ranger, que em 2002 assumiu as funções de Comandante da Inspecção-Geral do Exército. 

Em Penude e nas serras limítrofes éramos diariamente postos à prova e fizeram-nos aplicar os ensinamentos obtidos. 

(Uma patrulha de 4 parelhas, duas de aspirantes a oficial e duas de 1ºs. Cabos Mil. devidamente armadas!) 

O João Coroa Coelho (parelha) em cima do L da placa foi parar a Angola. Para não perdermos o hábito, os castigos continuavam, mas para pior, pois como estávamos organizados por parelhas, quando durante a noite ou madrugada tocavam uma ou mais vezes para alinharmos na parada correctamente fardados e equipados, se um se demorava um pouco mais a chegar ou não se apresentava em condições na revista o outro era igualmente penalizado. 

Por azar saiu-me na rifa o Coelho que era um sorna dos diabos. 



(Treino com faca num acampamento que foi montado para 3 dias. )

Nos Domingos à tarde davam-nos um bónus, deixavam-nos vestir à civil, enfiavam-nos dentro de uma camioneta com destino a Lamego e no centro da cidade faziam-nos saltar em cambalhota com a viatura em movimento, o que nos enchia de prazer e de orgulho pois as miúdas da terra paravam e ficavam a ver e, como tal, podíamos ter a sorte de começar um namorico. 

(Em Lamego juntinho a uma garota da terra, à noite houve baile).

No final das cerca de 10 semanas e depois de tanto penarmos só foi concedido aproveitamento aos 2 Alferes, 10 Aspirantes Milicianos e 12 Cabos Milicianos. 

Como recompensa, ofereceram-nos uma visita às Caves da Raposeira e um distintivo para o braço, que cada um passou a usar. Passados poucos meses todos os que frequentaram o Curso foram mobilizados para Angola, Moçambique e Guiné. 



(João Parreira, de pistola em punho para um esqueleto, algures na zona de Bissorã - Guiné). 

Por fim e não menos importante resta registar os meus agradecimentos aos ex-Combatentes da Guiné, mencionados no texto: Dr. Luís Graça e Torcato José Mendonça, que permitiram esta publicação. 

Fotos: © João S. Parreira (2009). Direitos reservados 

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