No âmago da acção
Um dia reli no bloquito de notas
Umas frases de uma anotação
Duma história inacabada... dizia:
Nome de código: Operação Ficção
Um civil acorrera a informar
Que avistara um grupo "in" ali perto
Cerca de vinte homens bem armados
O combate era mais que certo
Missão: Pesquisa e destruição
Daquelas onde o sangue corre
Trilhos... mato... armas... tiros
Onde se mata... onde se morre
Avançávamos a muito custo
Atolados na lama da picada
A trovoada e o céu escuro
Pressagiavam nova chuvada
O ar quente fustigava-nos o corpo
E o suor mesclado com a humidade
Deslizava-nos pela pele pegajoso
Aumentando a incomodidade
À nossa volta os mosquitos zumbiam
As suas picadas vorazes... irritavam
As redes enroladas em torno da cabeça
Só os olhos por uma nesga espreitavam
Na época das chuvas os ponchos
Eram bons abrigos mas estorvavam
Tolhiam os gestos perigosamente
E... os reflexos é claro... retardavam
O tarrafo ali era denso... “suspeito”
Os sentidos vão em alerta total
Os dedos roçam tensos nos gatilhos
Rebusca-se todo e qualquer sinal
De vez em quando uma "boca" soa
- Rai’s partam tanto lamaçal!
A humidade ía até aos ossos
Baixando o ânimo e o moral
A coluna seguia lenta... apeada
Os homens iam bem espaçados
Numa fila longa e serpenteante
Em silêncio... no mato concentrados
Saíramos do quartel há duas horas
Em missão de reconhecimento
Num percurso em qu’era habitual
O inimigo fazer o seu aparecimento
A rotina tornava-nos máquinas
O tempo e a acção... experientes
A tensão permanente... insensíveis
O perigo e a morte... indiferentes
Valia-nos a sã camaradagem
A partilha dos sonhos... dos receios
A entreajuda física e psíquica
A divisão das tarefas e dos meio
O convívio entre o pessoal
Era fraterno... sincero... leal
As amizades enraizavam-se
Puras... firmes... fora do normal
Continuávamos a caminhar... atentos
Perscutávamos no mato incansáveis
Um movimento... um som... um odor
Um indício dos “turras” insondáveis
Pensa-se nas instruções... uma a uma
Nas minas... nos perigos qu'estamos a correr
Ansiosos que nada aconteça
Mas prontos para o que der e vier
Pensa-se nos objectivos pré-definidos
Na surpresa... na eficácia... no dever...
Se seremos o caçador... ou a presa?
Sob o lema: Antes matar que morrer!
O prenúncio das hostilidades
Vai arrefecendo e secando o suor
A garganta parece dar um nó
A atenção é cada vez maior
Aos poucos o sangue acelera
O cérebro esvazia-se lentamente
Atenção ali... algo se mexeu...
Nada!... É só uma ilusão da mente
Da frente vem uma indicação: “
- Foi detectada uma mina!”
Tudo em alerta d'imediato
Aceleram os níveis d'adrenalina
Excitação... angústia... tensão
Os olhos ardem da busca apurada
Engole-se a escassa saliva
Os ouvidos aguçam-se... mas nada
Um tiro... dois... está tudo a mexer…
Procurando uma boa protecção…
Mais tiros... explosões de granadas…
Procura-se o “in” no meio da confusão…
As balas às centenas zumbem no ar…
Em todos os sentidos e direcções…
Buscam a vida em nome da morte…
Com a mais maléfica das intenções…
Vozes, ordens, gritos... gemidos de dor…
Numa amálgama digna do inferno…
Matar ou morrer num crepúsculo dantesco…
Impulsos, emoções, heróis, final… eterno!
Luso sangue salpica a fria terra
Brotando das carnes feridas... rasgadas
Vidas que se esvaem pela Pátria
Aqui... longe... em África... nas picadas
Daqueles que dão o seu melhor
Mais ou menos Heróis... sem presunção
Servindo e morrendo em nome de Portugal
Sem comentários:
Enviar um comentário